sábado, 24 de enero de 2009

Eu Imigrante

Antes da crise economica mundial, um dos assuntos mais destacados nos noticiarios da Espanha, durante meses, foi a questão da imigração desenfreada.
Como controlar a imigração, como frear a imigração, como combater a imigração...
O pensamento da parcela conservadora e ou radical da população espanhola é claríssimo: "A imigração é uma erva daninha que degrada a cultura e a tradições do país, que usurpa os empregos da população local, que traz malefícios ao desenvolvimento social."
E quando ouço isso me vem aquela sensação: "parece que eu já vi esse filme?!". A verdade é que todos latino-americanos já o vimos, e somos parte desse filme, do qual os protagonistas são os próprios europeus.
Agora se aplica aqui no velho mundo aquele conhecido ditado que diz: "pimenta nos olhos dos outros é refresco".
Acredito eu, que o ser humano é um ser migrante por natureza, há milênios esse fenômeno acontece. E não há mal nenhum em buscar outros espaços e novas perspectivas. Mal há na maneira como se busca esses espaços e perspectivas.
Acho que antes de pensar em condenar ou discriminar o imigrante aqui no Velho Mundo, o indivíduo deveria analisar sua consciência, averiguar a história dos povos dominados e reconhecer que seus antepassados não atuaram nada bem quando migravam a outras terras. E que até pouco tempo atrás, os imigrantes eram os próprios Europeus.
É só olhar pro lado, veremos nos traços de cada Brasileiro a assinatura portuguesa (claro), indigena, italiana, alemã, africana, turca... Somos resultado de migração sobre migração. A nossa história não é muito bonita e romantica, nossa cor antes de tudo foi pintada com muito sangue.
Quando cheguei aqui em Barcelona, me impressionei com a divesidade de nacionalidades que encontrava em cada caminhada que fazia. Barcelona tem cor, tem som, tem cheiro e sabor dessa mistura. E sem ela, Barcelona não tem a menor graça. É maravilhoso conhecer o mundo através de relatos, estimular o imaginário e a vontade de conhecer lugares. As pessoas contam suas histórias, nós contamos a nossa, e celebramos essa explosão cultural.
Esse intercâmbio que para mim resulta maravilhoso, incomoda a um montão de gente, aos devotos do PP (a direita conservadora espanhola), aos devotos de Sarkozy e Berlusconi, aos muitos desinformados dominados pela ignorância histórica, a muitos fascistas que querem limpar sua nação (e continuar sujando outras).
No dia dia de imigrante, ouço muitas coisas insolitas que nem valem citar. O mais insólito é ouvir tudo isso da boca dos herdeiros de expedicionarios que destruiram culturas e populações inteiras, por poder, por terras e riquesas naturais.
Nós os imigrantes da atualidade queremos muito menos que isso, queremos conhecer, queremos novas possibilidades, muitos querem dar novas possibilidades as suas familias (devastadas pela colonização). E isso incomoda profundamente, quando o cenário da história passa a ser "A Intocada Europa", que sempre invadiu e dominou, e agora está sendo "invadida", por seu filhos e netos bastardos. Somos bastardos, admirados, boquiabertos, deslumbrados, com os palácios e belezas comprados a custa do sofrimento de muita gente, do sangue da áfrica e da exploração das nossas próprias nações.
Talvez não teria essa clareza de pensamento e consciência se não viesse pra cá, para ver, sentir e viver essa história (e outras histórias maravilhosas, claro!).
Passado, um passado muito recente, que ainda palpita em muitos cantos do mundo. Temos que começar atuar, para virar a página, uma difícil tarefa... livrar-nos do rancor histórico, e arrancar o preconceito dos corações rochosos.
O certo é que temos que rever nossas opiniões, conceitos e comportamentos a todo instante, para não cair na imbecilidade. Digo imbecilidade pois nós sem querer condenamos e julgamos "imbecilmente", muita gente que faz parte do nosso dia dia, na rua, no metrô, em casa... e como somos imbecís em casa! Se somos vítimas da imbecilidade, temos que nos esforçar para não ser tal qual. Eu estou tentando através da escrita, dos meus desabafos, e tem funcionado, de forma gradual e lenta!
Assim o mundo se tornará muito menor do que imaginamos, e as fronteiras não existirão, ao menos dentro da gente!